10 Anos de Salipi
Não é que tive outra vez a sensação, na última quarta-feira, de ser uma pessoa abençoada. Tudo por conta de mais um Salão do Livro do Piauí, do qual sou um dos organizadores, lançado em noite prestigiadíssima, no Palácio da Música. Acredito que os outros quixotes – Cineas, Romero, Jasmine, Kássio – tenham experimentado coisa semelhante. Embalados pela voz encantadora de Soraya Castelo Branco, quem sabe estivéssemos ouvindo também os sábios versos do poeta baiano: “Oh! Bendito o que semeia / Livros… livros à mão cheia… / E manda o povo pensar! / O livro caindo n’alma / É germe – que faz a palma, / É chuva – que faz o mar.” Já são agora dez anos, completados em 2012, semeando livros entre os piauienses, tanto no Salipi daqui como nos que depois surgiram no interior. Sem falar do tempão em sala de aula, celebrando o livro e incentivando o saudável hábito da leitura.
Contrariando essas profecias catastróficas, que remontam a longas datas, reafirmamos ali, em alto e bom som: “O fim do mundo é não ler”. E sugerimos, para abrir o apetite, a obra instigante de Francisco Pereira da Silva, nosso teatrólogo campo-maiorense, com peças ainda hoje encenadas nacionalmente, a exemplo de Raimunda Pinto, sim senhor; a prosa lírica e questionadora de Jorge Amado, o consagrado “Romancista do Cacau”, autor de Gabriela, cravo e canela e Capitães da areia, dois clássicos da literatura brasileira; e os textos eróticos e provocativos de Nelson Rodrigues, o saudoso e sempre atual “Anjo pornográfico”, com livros que insultam o falso moralismo burguês a partir dos títulos adotados, tais como Bonitinha, mas ordinária e Toda nudez será castigada. A viagem cultural será completa, sentado em poltrona ou deitado em rede, se o leitor tiver a brilhante ideia de botar um CD de Luiz Gonzaga para tocar.
Tomado gosto pelos autores homenageados, todos nordestinos da melhor qualidade, é hora de degustar também iguarias literárias de outras regiões, tanto deste imenso Brasil quanto de fora, a começar por Zero, do paulistano Ignácio Loyola Brandão, romance que renovou a moderna ficção brasileira, censurado pela ditadura e aclamado pelos críticos; os belíssimos contos reunidos em O voo da madrugada, do carioca Sérgio Sant’Anna, com seus personagens marcados pela solidão e a ponto de saltar no precipício; a envolvente narrativa de O filho eterno, do talentoso Cristovão Tezza, curitibano que levou prêmios importantes com esse texto que mostra a complexa relação entre um pai e o filho portador de Síndrome de Down; e os marcantes versos de Entre dois rios e outras noites, da poetisa Ana Luísa Amaral, voz feminina que desponta ultimamente na literatura portuguesa.
Se ainda for pouco, o Salipi tem outros nomes no cardápio deste ano, todos desembarcando em Teresina no mês de junho, mais precisamente no período de 10 a 17, quando a Praça Pedro II será tomada por um formigueiro de gente a fim de consumir livros e conversar com seus autores preferidos. O espaço do Theatro 4 de Setembro ficará pequeno, por exemplo, com tantos fãs querendo ouvir Bruna Lombardi falar sobre essa interessante combinação entre literatura e cinema. Ou, quem sabe, curiosos em ver a convidada cubana, Roxana Pineda, protagonizando um espetáculo de máscaras com textos de Eduardo Galeano. Noite memorável, realmente, a da quarta-feira passada, porque fizemos, além do lançamento oficial da 10ª edição do Salipi, uma merecida homenagem a dois piauienses que dedicaram sua vida a fomentar cultura em nosso meio: Marcus Peixoto e Helly Batista. Que eles continuem, com a generosidade que os caracterizava, a nos apoiar e incentivar, lá de cima.